domingo, 12 de fevereiro de 2012



O POVO NÃO AGUENTAR MAIS,







ESTÁ PRONTO PARA


OBEDECER AO  GRITO

ABAIXO MATÉRIA ENVIADA POR EMAIL-

Rrose Selavy<rrsslv2@gmail.com> 



*O artista hoje: entre o 'proponente' e o pedinte*



O artista que passa o tempo recluso na solidão do ateliê, trabalhando,
desenvolvendo sua experiência estética, como um operário da linguagem e do
pensamento, está em extinção. É coisa de museu.

Ou melhor, é raridade nos museus de arte, que estão deixando de ser
instituições de referência da memória para servir de cenários para
legitimação do espetáculo. Às vezes, com míseros recursos que ficamos até
sem saber direito: quando nos deparamos com baldes e bacias nessas

instituições, se são para amparar a goteira do telhado ou se se trata de
uma instalação, contemplada por um edital para aquisição de obras
contemporâneas...

O que interessa na politica cultural nem sempre é a arte e a cultura, e,
sim, o *glamour*. Em nome da arte contemporânea, faz-se qualquer coisa que
dê "visibilidade".

As políticas públicas foram relegadas às leis de incentivo à cultura e aos
editais públicos. Nunca se fez tantos editais neste País, como atualmente,
para, no fim das contas, fazer da arte um "suplemento cultural", o bolo da
noiva na festa de casamento.

Na fala do filósofo alemão Theodor
Adorno<http://pt.wikipedia.org/wiki/Theodor_W._Adorno>:
"As obras de arte que se apresentam sem resíduo à reflexão e ao pensamento
não são obras de arte". Do ponto de vista da reflexão, do pensamento e do
conhecimento, a cultura não é prioridade. Na política dos museus, o objeto
já não é mais o museu que se multiplicou, juntamente com os chamados
"centros culturais", nos últimos anos.

Com vaidade de supermercado, na maioria das vezes, eles disponibilizam
produtos perecíveis, novidades com prazo de validade, para estimular o
consumo, vetor de aquecimento da economia. A qualificação ficou no papel,
na publicidade do concurso.

Esses editais que bancam a cultura são iniciativas que vêm ganhando força.
Mostram ser um processo de seleção com regras claras para administrar o
repasse de recursos, muito bem vendidos na mídia, como métodos de
democratizar o "acesso" e a "distribuição de verbas" para as práticas
culturais.

Mas nem são tão democráticos assim. Podem ser um instrumento possível e
eficiente em certos casos, mas não são a solução, é possível funcionarem,
também, como escudo, para dissimular responsabilidades pela produção,
preservação e segurança do patrimônio cultural.

Considerando-se, ainda, a contratação de "consultorias", funcionários,
despesas de divulgação, inscrição... o trabalho árduo e apressado de
seleção... é tudo, enfim, um custo considerável, que, em último caso, gera
"serviços" e renda.

O artista contemporâneo deixa de ser artista para ser proponente,
empresário cultural, "captador" de recursos, um especialista na área de
elaboração de projetos, com conhecimentos indispensáveis de "processo
público" e interpretação de leis. Dedica grande parte de seu tempo a esse
negócio burocrático, que é a elaboração e execução de projetos, prestações
de contas etc., todos contaminado pela lógica do *marketing*... coisas
incompatíveis com o artista em si, que apostou na arte como uma "opção de
vida" e com forma de conhecimento, algo que exige dedicação exclusiva...

Ou, pior ainda: o artista fica à mercê de uma "produtora cultural", para
quem essa política de editais e fomento à cultura é, aliás, um excelente
negócio...

Mais uma coisa é preocupante: e se essa política de editais se estender até
a sucateada área da saúde, por exemplo? Imaginem uma "seleção pública" para
pacientes do Sistema Único de Saúde, que necessitem de procedimentos
médicos... Os que não forem "democraticamente contemplados", teriam de
apelar para a providência divina, já engarrafada com a demanda de tantos
pedidos...

Nem é bom imaginar. Que esta praga fique restrita aos limites da esfera
cultural... Na pior das hipóteses, é uma "torneira" que sempre se abre para
atender parte de uma superpopulação de artistas, proponentes, pedintes...

O artista, cada vez mais, é um técnico passivo com direito a diploma de
"bem comportado" em "preenchimento de formulário". E seu produto ficou
relegado ao controle dos burocratas do Estado, e à "boa vontade" dos
executivos de *marketing* das grandes empresas...

Se o projeto é bem apresentado, com boa "justificativa" de gastos e
retornos, o produto a ser patrocinado ou financiado... se é mediano, se é
excepcional, não importa! O que importa é a "formatação", a "objetividade"
do orçamento, a clareza das "etapas" e a "visibilidade", o "produto
final"...

Como sempre, existem as chamadas exceções, mas...

*Almandrade*

(artista plástico, poeta e arquiteto)

http://www.digestivocultural.com/colunistas/coluna.asp

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- Karen Sá disse no "cultura e mercado":

A política de editais confirma que a tentativa de impregnar o governo, ou
melhor, o Estado, de um conceito antropológico de cultura está longe de
tornar-se realidade.

Na verdade a forma de encarar a cultura sempre será uma disputa de poder
que começa pelo próprio conceito, pela definição sobre o que é cultura,
eternizada nos critérios de escolha dos projetos resultado da visão de
cultura de quem os definem, de quem está no momento com esse poder.

Seu exemplo da saúde é perfeito! Essa política de editais faz exatamente
isso com as pessoas, que no caso da cultura não são pacientes que ora são
contemplados ou não, podendo ou não ser atendidos pelo SUS. Mas são pessoas
ou grupo de pessoas que tentam simplesmente se autorepresentar, existir.

O fato é que seja através da saúde ou da cultura, a falta de apoio, de
recursos, de estrutura leva a morte. Sei que para alguns essa analogia é
esdrúxula, mas não é.

A falta de espaço de representação, da práxis, e a ausência de
oportunidades de realizar a representação de seus espaços, leva ao
desaparecimento das culturas porque a preservação de um modo de pensar só é
possível se ele for praticado. Isso o fortalece.

Essa política de editais demonstra que a cultura é um negócio capaz de ser
selecionado e objetificado e não uma necessidade humana de existir e, que
enquanto necessidade, um direito não pode passar por uma triagem.

Me parece que a visão monolítica do Estado não será capaz de administrar a
cultura em seu sentido antropológico, mesmo publicando aos quatro cantos o
discurso da descentralização. É necessário retroceder ao estado de Estado,
pensar pequeno, viver em feudos. As próprias formas de financiamento é
fruto de uma forma de pensar a cultura. Por que deve existir uma única
forma, por que uma política para todo um país tão diverso. Conceito
antropológico de cultura e Estado parecem inversamente proporcional. Quanto
mais leio Castoriádis mais claro fica para mim o paradoxo.

www.culturaemercado.com.br

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